14 de Outubro, Domingo |
Fomos almoçar com os meus pais. O Pedro tinha imenso trabalho para fazer e irrita-se sempre com a mania que os meus pais têm de nos dar dez minutos de antecedência para estas coisas em vez das educadas 24 horas, mas fomos à mesma.
É sempre a história do costume com o meu pai a tentar fazer piadas à custa das outras pessoas, principalmente a minha mãe, mas como a conversa se virou para a possibilidade de eu e o Pedro virmos a ter filhos, as piadas viraram-se para mim sob a forma de comentários estilo 'tu vais ser uma daquelas mães que...' que não deixa mais ninguém pegar na criança, que não suporta as avós, etc.
De repente tive flashbacks de uma série de situações idênticas da minha adolescência em que o meu pai me tentava catalogar em qualquer estereotipo, possívelmente comparando-me com pessoas que conhecia, dizendo que eu ia aderir a esta ou aquela moda, etc, e não me lembro de ele ter razão muitas vezes. Os comentários terminam sempre com o famoso 'depois vais ver' e ficamos por aqui.
Na verdade eu nunca encaixei nos moldes e acho que o problema é exactamente esse. Acho que é mais 'wishful thinking' do que outra coisa. Se calhar teria lidado melhor com uma adolescente normal, que só veste roupa de marca, começa a fumar aos 14 anos, tem um número interminável de namorados, passa noites fora em casa das 'amigas', etc.
Há uns anos era a história de que me ia dar muito mal com a minha sogra - fosse ela quem fosse. Só porque isso é comum. Mas não se pode generalizar. Aliás, acabei por ter uma sorte fenomenal e tenho uma sogra maravilhosa e de quem gosto bastante. Por isso, e se nem eu sei como é que vou ser quando tiver a responsabilidade de cuidar de um ser humano, como é que ele pode saber? A pessoa com quem eu vivi aqueles anos todos e que nunca me conseguiu compreender?
Depois foi a confusão do casamento do meu primo. Tenho o azar de ter uma carrada de primos, todos mais ou menos da mesma idade e casam-se à média de um por ano. Todos pela igreja, ainda por cima, com todas aquelas coisas super irritantes dos casamentos. Já estou farta.
Quando ainda por cima me dizem que é num dia de semana e relativamente cedo, quando uma pessoa já tem as férias até ao fim do ano agendadas, é verdadeiramente irritante. E pior que tudo, há aquela pequena questão do meu desconforto quando em companhia de mais do que duas pessoas.
Percebi finalmente que o meu lado anti-social não vem de ódio à raça humana mas sim de um desconforto total na presença de outros seres humanos. Não quero mal a ninguém mas nunca me sinto pior do que quando estou rodeada de pessoas. Mesmo pessoas que conheço relativamente bem. É um dos meus maiores pesadelos. Sinto-me completamente isolada e só quero é ir-me embora o mais depressa possível. E tenho reacções que nem sempre consigo controlar. Como me sinto mal, entro em modo defensivo e chego a ser bastante agressiva sem dar por isso. Não sei se alguma vez vou ser capaz de ultrapassar isso mas acho que toda a minha vida tem convergido para o ponto em que, se tiver sorte, vai chegar o dia em que nunca mais tenho que sair da cama ou falar com ninguém.
Tenho mudado de emprego de forma a estar em contacto com cada vez menos pessoas, até chegar a um ponto em que só tenho que lidar com outras 3 e muitas vezes limito-me a ficar em casa em frente ao computador não falar com ninguém.
Nos dias em que os homens que andam a fazer as obras do meu prédio andam a passar à janela, começo a sentir a ansiedade a subir porque me retira a sensação de segurança que é estar em casa.
Reagi mal ao início das aulas de música deste ano ao ponto de pensar em desistir.
Enfim, os exemplos são multiplos, passando ainda pelas horas que passo a ver filmes, o que implica ver pessoas sem ter que coexistir, etc.
Mas é a única forma de eu ter alguma espécie de conforto. E quando é preciso sair de casa e interagir, ponho a armadura e faço o que tenho a fazer, mas não posso dizer que goste. |
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